Jorge Antunes
Diogo Ramalho me enviou e-mail cobrando-me novo artigo para O Miraculoso. Comecei a arquitetar, na cabeça, uma desculpa para a minha omissão. Ele, desde o início, conta com um texto meu a cada semana.
Eu precisava dizer a ele a verdade. Cheguei a rascunhar. A verdade é que estou sem motivação. Sem vontade de escrever textos em prosa. Tenho escrito poemas. Meus sentimentos andam abalados com os acontecimentos recentes. Quando isso acontece fico sem ganas de me estender em frases, frases e frases. Dou preferência à composição musical, à poesia, às imagens poéticas, à aliteração, ao jogo com as palavras, à concisão. As novas denúncias contra militantes e ex-militantes do PCdoB, que em nada me surpreendem, foram as primeiras causas de meu mutismo. A podridão grassa nos poderes constituídos e, quando me lembro de que quem está na cúpula dos comandos nacionais são canalhas indicados pelos canalhas eleitos pelo povo, me dá um desânimo total.
Palavras de nada têm servido. Gritos tampouco. Clamores tampouco. As marchas contra a corrupção foram recuperadas pela direita. Fico apavorado. Jovens que detestam partidos políticos começam a ser arrastados às ruas, para participar de marchas que passam a ser chamadas de “desfiles” e não mais de “passeatas”.
Na condição de sexagenário que teve a juventude alijada da vida nacional graças ao exílio, começo a pensar que tudo pode voltar. Os golpistas de 1964, poucos se lembram, não se diziam meros anticomunistas. Diziam-se também combatentes contra a corrupção. A Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que reuniu 400 mil pessoas, foi forte apoio da sociedade civil ao golpe militar.
As últimas gotas d’água, que abalaram minha verve em prosa, foram o assassinato bárbaro de Kadafi e o programa político do PCdoB na TV. A canalha oportunista, entreguista, antipovo e adesista do PCdoB, usou figuras heróicas brasileiras, na iconografia do programa, para tentar validar seu discurso falsamente socialista. Revoltou-me a utilização de fotos de Luiz Carlos Prestes e de Olga Benario, duas figuras máximas da luta socialista no Brasil.
Hoje, dia 21/10/2011, a professora Anita Leocádio Prestes, filha de Olga e Prestes, divulgou uma carta aberta à direção do PCdoB que diz, com fundamento e propriedade, do sentimento meu e de todos os verdadeiros socialistas brasileiros.
Transcrevo aqui a carta de Anita. O texto dela é o artigo que dou a O Miraculoso esta semana. Faço minhas as palavras de Anita.
Ao Comitê Central do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)
Dirijo-me à direção do PCdoB para externar minha estranheza e minha indignação com a utilização indébita da imagem dos meus pais, Luiz Carlos Prestes e Olga Benario Prestes, em Programa Eleitoral desse partido, transmitido pela TV na noite de ontem, dia 20 de outubro de 2011.
Não posso aceitar que se pretenda comprometer a trajetória revolucionária dos meus pais com a política atual do PCdoB, que, certamente, seria energicamente por eles repudiada. Cabe lembrar que, após a anistia de 1979 e o regresso de Luiz Carlos Prestes ao Brasil, durante os últimos dez anos de sua vida, ele denunciou repetidamente o oportunismo tanto do PCdoB quanto do PCB, caracterizando a política adotada por esses partidos como reformista e de traição da classe operária. Bastando consultar a imprensa dos anos 1980 para comprovar esta afirmação.
Por respeito à memória de Prestes e de Olga, o PCdoB deveria deixar de utilizar-se do inegável prestígio desses dois revolucionários comunistas junto a amplos setores do nosso povo, numa tentativa deplorável de impedir o desgaste, junto a opinião pública, de dirigentes desse partido acusados de possível envolvimento em atos de corrupção.
Atenciosamente,
Anita Leocádia Prestes
Nenhum comentário:
Postar um comentário